terça-feira, 25 de junho de 2013

DO BRASIL A TELAVIVE COM BREVE PARAGEM EM LUANDA


Li ontem uma coisa no Facebook que me fez pensar – o que por si só é façanha de tomo, sob dois aspectos cruciais da existência desta alminha: primeiro ter interesse em algo escrito no Facebook, e depois o facto de ter pensado. Pode não parecer mas é coisa que é pouco usual. Passando a fase de auto-indulgência e autocomiseração do texto, devo pois declarar por escrito aquilo que me pôs a pensar. Dizia alguém, de quem admito ter feito mal em não reter o nome (pode dar-se a possibilidade de quem assim falar não ser gago mas poder ser preso e estarem a oferecer uma recompensa), que “Parem de chamar crise ao capitalismo!”.
A expressão pode parecer um chavão. Não o é. É até uma criação imaginativa e de alguma forma me espanta não ter sido eu a pensar nisto antes, e daqui podem tirar umas lições acerca de como passar da autocomiseração ao hedonismo mais exacerbado, ainda que vincado pela negativa, muito à maneira do celebrado Maquiavel. Não que me compare a Maquiavel, até porque ele viveu numa era que nada tem a ver com a nossa, ainda que se conservem certas similitudes. Eu sou mais dantesco, até porque comédias divinas são comigo, e comédias temos em todas as eras, políticos é que nem por isso.
Mas será que a expressão que li a alguém que deve estar já referenciado na CIA como perigoso esquerdista, à maneira deste vosso amigo, ao que diz o fugitivo do momento, que tenta fugir à CIA (é menino…), é um facto? E isto apelando à atenção do leitor, por eventual que seja, aplicado ao Brasil? Os acontecimentos no Brasil parecem desmentir a expressão. O Brasil é governado por um governo de esquerda – não há esquerda mais esquerda no Brasil que o PT de Lula. Já o de Dilma, deixa dúvidas. Não quero com isto dizer que o governo de esquerda no Brasil está a ser alvo de protestos porque já não é de esquerda. Longe disso. Eu ainda penso que o governo brasileiro ainda é de esquerda. E também devemos pensar que este governo de esquerda ofereceu uma coisa ao Brasil que o país nunca havia tido: uma classe média. E é essa mesma classe média que agora protesta por mais e melhor. Ou seja, uma chamada de atenção ao governo – provavelmente não terão governado da pior das maneiras, como nos tempos da ditadura militar ou de Tancredo – mas pode e devem fazer melhor.
E no que se refere a política externa, bem pode a Dilma pelo menos disfarçar a atitude de ida ao Minipreço quando se desloca a Portugal para comprar só os nossos CTT ou a nossa PT como quem arremata um kg de jaquinzinhos na banca dos congelados por um euro e noventa e nove. E aqui entra de novo a expressão que li no Facebook, imaginada por uma mente obviamente brilhante ainda que não minha, situação, aliás, demasiado aflitiva para descrever por palavras condizentes com o resto do texto – até porque hoje decidi não chamar nomes a nenhum político português, muito menos quero espalhar poios pelos ares, ainda que maduros e esperançosos num futuro que tarda em retirar os cranianos apêndices marfínicos que espetou, inexoravelmente e com algum estrondo relativo, na parede.
A verdade é que os tiques de nova-riqueza dos governantes brasileiros, que agora não são exactamente estrangeiros, segundo uma segura opinião, me deixam assustado e até concordante com a expressão “Parem de chamar crise ao capitalismo”. E isto para não falar em angolanos… Mas, por falar em angolanos, que orgásmico foi o serão, ao ver Henrique Zimmerman, um dos nossos maiores jornalistas, se é disso que se trata (?), fazer a apologia do paraíso na Terra que é Angola! Apesar de “até os governantes admitirem que ainda existe muita corrupção no país”… É que é preciso ter aquilo a que o povo indulgentemente chama de “lata” ou o brasileiro “topete”, mas que eu prefiro referir como simples existência de recipiente metálico que tem finalidade de cozinhar ao fogão. Depois percebi. Afinal não são só os chineses que estão a construir as famosas cidades-fantasma angolanas… Parem de chamar crise ao capitalismo!


sexta-feira, 7 de junho de 2013

POVO COM FRESCURA

Ilustração Marco Joel Santos

Nunca ninguém diga que Portugal não é um país inovador. Portugal é provavelmente o mais inovador de todos os países do mundo. Particularmente em algumas áreas de especialização. Uma dessas áreas em que recentemente os portugueses se especializaram é o direito da greve, ou direito à greve. O português inovou e surgiu um inteiramente novo código legal em torno da greve e do direito a fazer-se a dita.
Assim, os portugueses acham que as greves devem ser feitas em alturas especiais, conforme as áreas de actividade. Assim, podemos distinguir:
·         Greve de professores – inteiramente permitida, excepto em períodos lectivos, de exames, de correcção de testes ou exames, de divulgação de testes e exames, em qualquer dia que afecte o futuro do filho de pelo menos um pai português e ainda quando não chove;
·         Greve de maquinistas – inteiramente permitida, excepto no interior de veículos eléctricos de passageiros, a menos de 50 kms de qualquer instalação da Refer ou CP, se houver pelo menos um português que queira viajar de comboio ou metro, e ainda quando não faz sol;
·         Greve de médicos – inteiramente permitida, excepto no decorrer de dias de consulta, cirurgia, tratamento, quando pelo menos um português está doente e ainda quando o Papa Chico aparece na TV;
·         Greve enfermeiros – inteiramente permitida, excepto em dias de tratamentos, cirurgias, acompanhamento de doentes, quando pelo menos um português tenha uma injecção para levar e ainda quando o Gaspar falha uma previsão;
·         Greve de juízes – inteiramente permitida, excepto em dias em que ocorram diligências, julgamentos, audiências, inquirições, quando pelo menos um português esteja a ser julgado ou justiçado e ainda em dias que a mulher-a-dias não lavou as togas;
·         Greve de camionistas – inteiramente permitida, excepto quando envolve camiões. Também não é permitida quando o camionista descansa em longo curso, nem quando pelo menos um português vai fazer compras ao Belmiro;
·         Greve de pilotos aéreos – inteiramente permitida, excepto em dias em que ocorram voos, quando pelo menos um português pense viajar de avião e também quando as hospedeiras não vêm maquilhadas;
·         Greve de pescadores – inteiramente permitida, excepto em dias em que haja pelo menos um português que queira comer peixe; também não são permitidas se não houver barcos;
·         Greve de militares – inteiramente permitida, excepto em todas as ocasiões. Até se fartarem.
·         Greve de homens do lixo – inteiramente permitida, porque ninguém quer saber nada disso, não é nada importante. Excepto quando haja pelo menos 5 milhões de portugueses a viver com lixo até ao tecto.
·         Greve de funcionários do Centro de Emprego – inteiramente permitida, excepto quando exista pelo menos 17,5% de portugueses no desemprego;
·         Greve de nomeações do Governo – inteiramente permitida, excepto nos dias em que não haja boys a reclamar um tacho, ou quando se acabar a puta da lata;
Se os portugueses se deixassem da merda da frescura e lutassem pelo seu país… seria bom. Mas fizeram greve de cérebro, e não há previsão para a restauração da normalidade. Estima-se que cada dez portugueses tenham o QI de um peixinho de aquário, neste momento.


domingo, 2 de junho de 2013

A TERNURA DOS QUE ACOMPANHAM O PASSOS COELHO

Ilustração Marco Joel Santos
Exactamente há 40 anos nasceu um artista, um homem de raríssima veia poética, um monstro das letras, um escritor sublime. Um homem para além do seu tempo, um ser humano sem defeito, um humanista irrepreensível. Só tenho pena de não ter nascido no lugar desse cabrão e ser assim. Mas enfim, podia ser sportinguista.
O meu dia de aniversário foi como se segue: dois trabalhos despachados. O primeiro com alguma certeza do que dizia, o segundo a partir de leituras recomendadas pela professora do autor Pierre Chanu. Já leram Pierre Chanu? Não. Então vão sempre a tempo de cortar os pulsos antes de isso vos ser imposto, sabe-se lá por que lei da vida retorcida como um pé de couve-galega. Havia de lhe nascer um pessegueiro no cú a dar laranjas de Huelva. Sem casca.
Quanto ao facto de ter completado 40 anos de existência, devo afirmar a minha total inocência no caso. Há pessoas que são culpadas de ter feito 40 anos. Ou 50, ou até mais, como a nossa querida Maggie. Eu cá não sou de modas, por acaso cheguei aqui e com certeza daqui sairei para outro lado qualquer sem culpas no cartório. Os chineses é que costumam dizer que o Tempo não passa, nós é que passamos por diferentes zonas do Tempo. Só por causa dessa merda haviam de fechar todas as lojas dos chineses da minha terra. É o tempo e os impostos: os chineses passam pelos dois, nenhum os atinge.
Não vou contar a história da minha vida, apesar de ser de grande interesse pessoal. Pessoal como em pessoa, a minha. Ok, e de mais algumas pessoas que até fazem parte da minha vida e tal. Lamechices do catano. Mas o importante é que realmente a nossa vida não é só nossa, é de todos os que a queiram partilhar, contra ou não a nossa vontade. Estou a lembrar-me das Finanças, por exemplo…
Tudo isto só para agradecer a todos os que me conhecem bem o suficiente para me desejar um feliz aniversário. É certo que não foi. Foi uma merda de um dia cheio de stress, e ainda por cima com os telefonemas (alguns poucos) a aparecerem exactamente naquela altura em que eu estava a escrever sobre antitrinitarismo, messianismo e sobre a Inquisição Espanhola. O que foi um alívio do camandro.
Agora vou ali enviar os quadros de vendas de gasoil para o meu chefe, a quem vou ter o prazer de ver amanhã. Pena ser em Lisboa e às dez da matina. Por isso, fiquem todos bem. Os que já chegaram aos 40, já sabem como é. Aos que não chegaram, digo: melhor esta merda que um pau nas costas. Ou um pessegueiro a crescer no cú e a dar laranjas de Huelva. Sem casca.